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Onde quer que eu vá, eu vejo propaganda

Esse texto é uma reflexão profunda que me atormenta.

Eu cresci escutando um grupo de rap niteroiense chamado Quinto Andar. Não lembro bem quem me apresentou, mas desde a primeira vez que eu ouvi, eu achei absolutamente do caralho.

Nesse mesmo período, eu fui atormentado por um tumor no pé. Eu fiz, no período de 5 anos, 3 operações para me livrar dessa desgraça.

Para eu ter alguma coisa para fazer durante as semanas entediantes do hospital, um grande amigo meu me emprestou o mp3 player dele.

Nessa época não existia smartphones e apesar de existir laptops, nao tinha wifi abundante igual hoje em dia. Então os dias em cima do leito do hospital eram entediantes.

Além de ver “O Senhor das Armas” 20 vezes na televisão eu passava muito tempo ouvindo o iPod dele.

Ali, a minha obsessão pelo rap e, mais precisamente, pelo Quinto Andar surgia.

Aquilo me moldou de varias formas:

  • Curtia andar "largado"...

  • Curtia dar rolé de camelm (afinal, tem muita coisa boa, mas melhor nao tem)

  • Curtia a "madruga"..

  • "Quem nao vive pra servir nao serve pra viver" e por ai vai

Uma das músicas que mais me ecoava em mim era a Melô da Propaganda. Ela era uma crítica a quantidade de propaganda que existia naquela época. E olha que isso era la pra 2006. Imagina o que os autores da música pensam da propaganda hoje em dia. (Talvez tenha espaço para a Melô da Propaganda pt II)

Ben Horowtiz falou em 2011 que “Software is eating the world".

De Leve e companhia falavam “Propaganda is eating the world” na forma de música, 5 ou 6 anos antes:

Cê tá cercado! Mãos ao alto, ou melhor, no bolso

Isso é um assalto e nao é ICMS, mas o que ouço

24hs por dia, privatizaram meu sonho

sem descanso no sono, não tem espaco, onde ponho

minha cabeça pra dormir ta estampado o logo da Shell

e até na praia eu vejo aviõezinhos da Vivo no céu

a natureza é trocada por outdoor e não podia ser melhor

assim eu vejo Gisele Bündchen com vestido Dior

ouço sempre coisas pra facilitar minha vida

Eu nunca gostei de propaganda (quem gosta né?) e essa música me ajudou a entender melhor a dinâmica da propaganda

A ironia do destino

Em 2017 eu crio um aplicativo para ajudar a democratizar o acompanhamento de investimentos no Brasil. O nome era Real Valor.

Passei de 2 a 3 anos testando qual era a melhor forma de monetizar a plataforma.

Como cobrar uma assinatura mensal era contra o propósito de democratizar os investimentos, o jeito foi apelar para a boa e velha "propaganda".

Se eu falasse com o Eduardo de 2006, ele me diria que eu vendi a minha alma.

Hoje tenho a visão um pouco diferente. A propaganda no aplicativo era baseada nos dados de investimentos do usuário e direcionava ele para oportunidades de investimento melhores. Os usuários gostavam.O aplicativo deu certo e a gente foi comprado pela Empiricus, a maior casa de relatório de investimentos do Brasil. E também uma das empresas que mais investia em Google Ads do Brasil.

Sim. Eu fui criado ouvindo Quinto Andar e odiando propaganda. Quis o destino que eu fizesse uma startup e ela monetizasse vendendo justamente o que eu odiava: propaganda.

Hoje eu já não tenho uma visão tão extremista sobre propaganda, mas essa reflexão é algo que vem à minha cabeça de tempos em tempos.

Eu me vendi? Se sim, é errado se vender?

Não sei… e escrever esse texto já me ajudou a me libertar desses pensamentos agoniantes. Pelo menos por ora.